Com a máxima vênia, ousei
utilizar este trocadilho, fazendo referência à oração em honra a Maria, mãe de
Jesus (baseada no cântico Magnificat – Evangelho de Lucas:
1:28-42), com o intuito de trazer ao leitor uma pertinente discussão, na seara
Criminalística, sobre o caso “Gil Rugai”, o qual entupiu todos os meios de
comunicação possíveis, nos últimos dias.
Neste
diapasão, enquanto operador da Ciência Criminalística, gostaria de
fazer uma releitura sobre o caso Rugai. Por este motivo, utilizo a expressão
"Rugai, por nós", lembrando que: se, por um lado, a Ciência Criminalística é técnica e científica (e, inexoravelmente, objetiva), por outro lado, os comentários
abaixo-publicados, não deixam de acompanhar as motivações ideológicas deste
subscritor, pecador contumaz e carente da Graça de Deus!
De antemão, peço desculpas pelo cartesianismo
(inerente da profissão) e lamento frustrar àqueles que esperam uma vasta
dissertação sobre os aspectos técnico-científicos que envolvem o referido caso,
haja vista que não participei do processo pericial. Não sou menino para cair
nessa armadilha antiética!
Alheio às discussões que envolvam os aspectos de uma
possível "Mariolatria", agradeço, antecipadamente, a você, leitor e
peço ao Filho de Deus (eis a possível incongruência Jesus-Maria):
"Rogai por nós, pecadores".
· Entenda
o caso:
O publicitário e
ex-seminarista, de 29 anos, foi condenado pela Justiça de São Paulo a 33
anos e nove meses de prisão pelos assassinatos do pai dele
(Luiz Carlos Rugai - 40 anos) e da madrasta (Alessandra de
Fátima Troitiño - 33 anos), mortos a tiros em 28 de março de 2004, na casa
onde viviam, em um bairro nobre da zona oeste de São Paulo.
A decisão foi anunciada na tarde do dia
22 de fevereiro de 2013 (Local: Fórum Criminal de Barra Funda), após o
júri considerar o ex-seminarista culpado, tomando por verdadeira a tese de que
ele cometeu o duplo homicídio, após o pai ter descoberto um desvio de dinheiro
da empresa da família (saliente-se que o pai, cinco dias antes de morrer,
expulsou o filho de casa).
O publicitário, por ser réu primário,
poderá recorrer da sentença em liberdade. Inicialmente, a pena deverá ser
cumprida em regime fechado. Após o cumprimento de, no mínimo, cinco anos, dois
meses e 15 dias de prisão (o que corresponde a um sexto da pena), Gil Rugai
poderá requerer a progressão do regime.
· Que
Salada!!!
Inicialmente, cabe um
pequeno registro sobre o depoimento do vigia que, estando em sua cabine de
trabalho, avistou o ex-seminarista, ora condenado, saindo da casa (local do
duplo homicídio), na noite do crime, acompanhado de outra pessoa.
Sobre a possibilidade de visualização, a partir da
referida cabine, o Doutor Ricardo Salada, ora Perito Criminal do Instituto de
Criminalística (IC) de São Paulo, afirmou: “foi constatado que era possível,
que não havia nenhum obstáculo que obstruísse a visão”.
E...
...ponto!
Isso não quer dizer que a
afirmação testemunhal seja verdadeira. Apenas que é possível! Há
uma grande distância entre essas duas afirmações. É possível: sim! O vigia,
realmente, viu? São outros quinhentos...
· Uma
piada de péssimo gosto...
Em depoimento, o
Perito-Médico, Dr. Daniel Romero Munhoz, confirmou que Gil Rugai tinha um
edema no centro do pé direito.
E...
...ponto!
O especialista,
sabiamente, evitou relacionar o ferimento ao chute que Rugai teria dado para
arrombar a porta da casa do pai (Luiz Carlos Rugai), antes de atirar
cinco vezes contra ele e outras seis vezes contra a madrasta (Alessandra de
Fátima Troitiño). Aqui, voltamos à velha questão: é possível que o edema
tenha sido causado por um chute na porta? Sim! Efetivamente, o edema foi
causado pelo chute naquela porta específica? Não (podendo, inclusive, o edema,
ter relação com outro evento traumático, que não "chute na porta").
Ao mais, o Perito Adriano Issamu Yonanime
(Instituto de Criminalística) admitiu ao final do interrogatório que houve um
lapso na realização do vídeo. Neste, o pé direito de Rugai é sobreposto ao pé
esquerdo de um sapato. Yonanime, admitiu que "na pressa, foi posta uma
imagem errada no vídeo" e prosseguiu: "A caverna [local onde o vídeo
é feito] é escura... foi um erro na escolha [fazendo referência ao par de
sapato]". Consigne-se que o equívoco ficou restrito à realidade
virtual, haja vista que a informação encontra-se correta no Laudo Pericial.
Aqui, entendo como perfeitamente justificável a alegação
do referido Perito Criminal, ante a quantidade e complexidade de Laudos
Periciais produzidos por estes profissionais, cotidianamente pressionados a
cumprirem prazos processuais, apesar dos déficits de: profissionais, estrutura
e política salarial.
Entretanto...
Alheio a tudo isto, o
perito Ricardo Molina não perdeu tempo: por conta do referido equívoco-virtual,
classificou a Perícia como uma "piada de péssimo gosto". O assistente
de acusação, Ubirajara Mangini, por sua vez, defendeu o trabalho do Laudo
Pericial, afirmando: "O vídeo não me
surpreendeu porque não importa a realidade virtual, mas a realidade processual.
E ela está perfeita em tudo". (grifo meu!)
Não satisfeito, Molina
também cobrou o paradeiro da folha da porta com a marca original do sapato, a
qual está desaparecida: "o pedaço da porta em que
estava a marca do pé desapareceu. Ele [Perito] disse que entregou, mas não está
nos autos do processo. Então, como vamos fazer a contraprova?"
O assistente de acusação "desvendou o
mistério": "tanto os sapatos como a folha da porta foram lacrados
[...] vai ter que verificar internamente no fórum. Mas, efetivamente, houve
um arrombamento"
Fico me perguntando: como evidências "desaparecem"
em um Fórum? (e aqui, meus dedoS lutam, como Se pediSSem para Substituir
determinada letra na oração retroconStruída!).
Por fim, mesmo que não mereça importância, gostaria
de registrar as meras alegações do advogado de defesa, Marcelo Feller, o qual
tentou desqualificar as provas técnicas, colocando em dúvida o caráter do
Peritos Criminais que participaram do "Caso Rugai".
Para tanto, sem apresentar qualquer prova no momento
da arguição, o advogado afirmou que os Peritos estavam sob investigação, sob a
acusação de venda de Laudos.
Sobre esta ponderação, a qual considero um grande
devaneio, não gostaria de tecer qualquer comentário, por considerar que 33
anos e nove meses de prisão (com Provas Periciais fundamentadas,
as quais nortearam todo o processo) são suficientes para apontar quem realmente
agiu com vileza e antiética.
Pericialmente,
Bruno Leal
Data vênia, entendo que além da prova material (mesmo que precária), da prova testemunhal (mesmo que contraditória), só as evidências são mais fortes que o princípio do "In dubio pró réus"!!!
ResponderExcluirÉ bom para os que mesmo exaustos, insistem em seguir na contra-mão da justiça (instituição), que hajam sopros de lucidez neste meio!!!
Este texto do competente perito e cientista criminal Bruno Leal é um alento para os que anseiam por uma prática jurídica livre de incompetência, desonestidade e falta de ética.
Operadores do direito criminal, ru(o)gai para que esse texto vos sirva de reflexão e consequente mudança de direção.
"Causídicamente",
Lamartine, Adv. OAB/PB nº 8368
Muito bom o texto do blog a respeito desse caso. Sobre o perito Molina, há algum tempo que percebo que ele quer ser muito mais que uma "estrela" nos casos em que tem sido convidado a trabalhar. Ele nem tem limites e nem mede consequencias para conseguir isso. Triste.
ResponderExcluirCaro Bruno,
ResponderExcluirSobre o caso, pericialmente falando, apenas dois esclarecimentos. O primeiro, sobre o pé errado. A única imagem do sapato que consta do laudo vem na dita "realidade virtual". Assim, dizer que no laudo está certo é, com o devido respeito, informação que não condiz com a realidade. Afinal, no laudo escrito não há qualquer foto do sapato.
Sobre os peritos estarem sob investigação, as notícias podem ser aqui acessadas:
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/789806-policiais-sao-presos-suspeitos-de-explorar-jogos-de-azar-em-sp.shtml
e
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff1406200716.htm
Atenciosamente,
Marcelo Feller
O seu artigo ”Ru (o) gai, por nós, pecadores!” despertou em mim tamanha atenção (inicialmente pelo título atraente) que só fui capaz de parar a leitura ao término das últimas linhas.
ResponderExcluirUm texto conciso, porém bastante coeso e que deixa transparecer toda a sua competência na área criminalística e sua sensibilidade como ser humano.
Meus parabéns pela forma como você escreve, e que tantos outros artigos, poesias e músicas sucedam como "frutos" da sua inspiração e sensibilidade para com o mundo das letras...
“Neste” planeta tão complicado a nossa sociedade carece de informações e de leituras saudáveis e inteligentes e você consegue atingir esse objetivo. Indiscutivelmente, o seu blog e os materiais nele postados são dignos não só de lermos, como também para recomendarmos aos nossos pares.
Que Deus o ilumine e que a “inspiração” esteja sempre presente em sua vida.
Atenciosamente,
Ana Ouro
Programa Estadual de Políticas sobre Drogas da Paraíba