terça-feira, 5 de outubro de 2010

EM QUÊ ACREDITAR? (PARTE I)

(Freud x Lewis)



Maravilhosa graça que alcançou
Um pobre como eu,
Que a mim, perdido e cego achou,
Salvo e a vista deu!
                              (John Newton)


Com o objetivo de tentar se desvencilhar de uma possível miopia do cotidiano sobre o tema, nada melhor do que tomar emprestada a lente da clareza, consciência e profundidade de dois autores que escreveram de forma abundante sobre suas visões de mundo.
Freud considerava que tomar viver nos “contos de fada” da fé religiosa poderia nos trazer algum consolo. Todavia, há de se considerar que, em longo prazo, haveremos de ter dificuldades: 

“Esse tipo de consolações não merece confiança. A experiência nos ensina que o mundo não é nenhuma creche” (Freud, The Questiono f Weltanschauung, em The Standart Edition of the Complete Psychological Works, vol. XXII, p.168)

Eis o ponto nefrálgico:

A visão do mundo espiritual é capaz de oferecer algum significado para os nossos dias aqui na Terra?

Freud acreditava que não, partindo do pressuposto que esse pensamento estava apoiado em algo que não era verdadeiro. Ou seja, fixar raízes na árvore da ilusão nos trará uma vida mais difícil (uma vez que está pautada em falsas esperanças). O confronto da rudeza da vida real deve ser enfrentado com o auxílio da verdade.
Na contramão destes pensamentos, Lewis se mostra interessado na percepção da realidade pautada na importância do nosso relacionamento com a “Pessoa” que nos formou. O estabelecimento deste relacionamento funcionará como condição sine qua non para a satisfação do ser humano (não há dinheiro, nem fama, no mundo que possam preencher esta lacuna).

Quem tem razão?

Na concepção deste que vos fala, a única via viável neste impasse encontra-se na observância da mudança de visão (uns diriam comportamento) de Lewis.
Aos 31 anos de idade, essa mola propulsora foi capaz de proporcionar direção e propósito na mente de Lewis (basta acompanhar o aumento da produtividade do mesmo). Poderíamos parar por aqui e já teríamos algum ganho. Todavia, o que a amplitude deste ganho vai mais além: Lewis era capaz de olhar no espelho do seu quarto e perceber uma nova criatura, com valores diametralmente opostos ao seu “eu” do passado e capaz de se relacionar de uma nova forma com o mundo exterior.
Irrelevante dizer que esta mudança revirou a vida de Lewis a esta altura. O foco que não existia (uma vez que apontava para si mesmo), agora passou a existis (nos outros). Mais a se dizer? Sim! As pessoas que conviviam com Lewis eram capazes de relatar uma mudança de temperamento, uma vez que esta “nova pessoa” se mostrava mais decidida e calma, da qual fluía tranqüilidade do seu interior. Os que estiveram com ele nos últimos instantes de sua vida, referiam uma alegria flexível, totalmente oposta ao antigo homem que vivia pessimista e desesperado.
Lewis preferia tratar, carinhosamente, dessa “experiência” como sendo “minha conversão”. Este termo estava presente no Antigo Testamento, quando o povo de Israel se afastou da idolatria e se CONVERTEU ao Deus verdadeiro. No Novo Testamento o termo significa NASCIDO DE NOVO.
A física no ensina que um trajeto é o espaço a ser percorrido. Todavia, a trajetória é a linha percorrida por um corpo em movimento. Lewis, definitivamente, havia mudado a sua trajetória!
Não tive a oportunidade de ser pai, ainda, mas nem precisarei desta experiência para dizer que o fundamento do relacionamento dos pais com os filhos está ancorado nos primeiros instantes de vida de uma criança (depois fica “um pouco mais complicado”).
Quando Nicodemos pergunta ao Cristo o que é necessário para entrar no reino de Deus, ele tem como resposta: NASCER DE NOVO. Nicodemos, confuso, não entendia como poderia voltar ao ventre da sua mãe e “renascer”, ao passo que o foi revelado pelo próprio Cristo que se tratava de um renascimento “espiritual”. 

"John Newton, uma vez um infiel e um libertino, um mercador de escravos na África, foi, pela misericórdia de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo, perdoado e inspirado a pregar a mesma fé que ele tinha se esforçado muito por destruir" (Lápide de John Newton)

Um comentário:

  1. Cara,

    Muito bom o texto. A descrição da conversão do Lewis me fez lembrar de quando eu me converti (será que eu sou metido? Querendo ser que nem o Lewis? rsss).

    Gostei do artigo sobre a nova concepção do Clássico x clássico também! Nunca tinha parado para pensar por esse ângulo de que definitivamente o clássico de hoje em dia não é como o de antigamente.

    Um grande abraço e vamos combinar com a galera pra se ver de novo. Faz tempo que não juntamos todo mundo.

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