Perito criminal e formação acadêmica
O Plenário iniciou julgamento de agravo regimental interposto de decisão do Min. Joaquim Barbosa, proferida nos autos de ação penal, da qual relator, movida pelo Ministério Público Federal contra diversas pessoas acusadas da suposta prática de crimes ligados ao esquema denominado “Mensalão”. A decisão questionada indeferira pleito defensivo em que se pretendia o fornecimento de dados sobre a formação acadêmica e experiência profissional de peritos criminais que atuaram no processo.
O relator desproveu o agravo, no que foi acompanhado pelos Ministros Luiz Fux, Cármen Lúcia e Ellen Gracie. Afirmou que os peritos seriam oficiais, designados pelo Instituto Nacional de Criminalística - INC, e que, a partir da leitura do disposto no art. 159, caput, do CPP (“O exame de corpo de delito e outras perícias serão realizados por perito oficial, portador de diploma de curso superior”), não haveria essa obrigatoriedade.
Em divergência, o Min. Celso de Mello deu provimento parcial ao recurso, para determinar que o INC forneça apenas a qualificação acadêmica dos peritos. Afirmou que essa exigência seria razoável, dada a possibilidade de que a formação técnica do perito designado, embora oficial, não seja compatível com o exame pretendido. Reputou, ademais, que tal prática permitiria à defesa impugnar a prova colhida a partir da perícia. Após os votos dos Ministros Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Cezar Peluso, Presidente, que seguiam a divergência, determinou-se colher, na próxima assentada, o voto dos Ministros faltantes.
AP 470 Décimo Quarto AgR/MG, rel. Min. Joaquim Barbosa, 28.4.2011. (AP-470)
Breves considerações:
Desnecessário ratificar a posição do nobre relator, bem como dos demais Ministros que coadunaram com o desprovimento do agravo. Com relação ao provimento parcial do Ministro Celso de Mello (e demais), há de se ponderar sobre as divergências presentes no voto em tela, no que tange à exigência descabida de que o INC forneça a qualificação dos peritos.
À primeira vista, poderíamos suscitar, tão-somente, a releitura do disposto no art. 159, caput, do CPP, o qual dispensa a obrigatoriedade em querela (cf. atentamente fizeram os Ministros que desproveram o agravo em comento). Todavia, mesmo admitindo a questão por resoluta, há de se considerar que os relatores-dissidentes agiram, na melhor das hipóteses, com ignomínia (na acepção de “desconhecimento”) ou desrespeito à atividade pericial e sua inexorável autonomia.
Ora! Inicialmente, há de se dizer que a Perícia Criminal, enquanto disciplina autônoma, é regida por leis, métodos e princípios próprios. Tal característica traz em seu bojo a plena independência das demais disciplinas. Costumo comparar, pedagogicamente, essa independência com o que bem predispõe a nossa Constituição Cidadã, em seu Título I, ao discorrer sobre os Poderes da União, em seu art. 2º. Destarte, nos relacionamos com as outras disciplinas com independência e harmonia!
Assim sendo, não se pode admitir que seja questionada a formação do Perito Oficial! Tal inquisição afronta, ainda, o caráter multidisciplinar da perícia, cerne da própria autonomia pericial.
É bem verdade que há técnicas particularizadas dentre a categoria de peritos criminalísticos e somos regidos por determinadas denominações funcionais. Considero, ainda, razoável que o Perito Oficial discorra sobre determinado objeto, com imbricação acadêmica correlata ao caso erigido (tal predisposição deverá ser "viabilizada" pelo chefe imediato).
Todavia, há de se pontuar que tal desiderato não está revestido de quaisquer caracteres imperativos (mais especificamente, no que se refere ao perito criminalístico na área de “perícias em geral”). Desta forma, não há que se questionar qual é a formação acadêmica do Perito Oficial, perante determinada situação.
É cediço, também, que o ocupante do cargo de Perito Oficial, além de atender às condições estabelecidas no Código de Processo Penal, foi submetido aos procedimentos de ingresso na carreira, os quais têm por requisito obrigatório o Curso de Formação, no qual o perito criminalístico, enquanto multidisciplinar, é capacitado para as mais diversas perícias criminais, adquirindo conhecimento técnico-científico para tanto, independente da formação acadêmica de ingresso.
Entretanto, “dos males o menor”! Mais risível (e trágico) seria o provimento do referido agravo. Custar-me-ia conceber Peritos Oficiais anexando aos seus laudos Diplomas Acadêmicos que os habilitem a atuar, ou não, em determinado processo, bem como anexar, ainda, um curriculum vitae com sua respectiva experiência profissional.
Por fim, considerando a celeuma por encerrada, ante sua cristalina compreensão, renovo os VOTOS DE AUTONOMIA aos amigos Peritos Oficiais, na certeza de que o enfrentamento de questões de elevada amplitude e abrangência – como estas – são necessárias para que possamos combater a combalida tergiversa.
Na certeza de que o navegar tortuoso é pressuposto indissociável para que possamos chegar algures e na esperança de um navegar, com remos próprios, por águas tranqüilas,
Pericialmente,
BRUNO VIANNA LEAL
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